Tuesday, July 08, 2008

Fogo Verde

Acordou bem cedinho como fazia há quatorze anos - até na hora de nascer foi maneira: insistiu muito em nascer junto com o sol, seis da manhã já estava gritando coisas aparentemente sem sentido -, saiu para caminhar ao lado dos pássaros que deram-lhe bom dia entusiasmados e ela respondeu a altura. Os olhos verdes e os cabelos cor de fogo davam-lhe um ar de moça nova e as poucas sardas, de menina tímida.

Foi para a escola cedinho como fazia desde os seis anos. Anotou tudinho em seu caderno rosa com plumas lilases. Assistiu o garoto de seus sonhos ser espancado em uma briga no colégio e ficou parada. Buscou algodão e água e limpou os ferimentos. “Estás bem?”, perguntou, “Agora contigo aqui estou.”, obteve como resposta. O garoto pegou-a pela mão e disse “Tu és a única que se importa comigo aqui.”, ela sorriu com os olhos e disse “Meu importamento vale por todos”. Ele levantou-se para beijá-la pela primeira vez na vida. Nunca havia sido tocada, o que fazer naquele momento tão ilustre? A vida toda passou em sua cabeça em um segundo, desde o primeiro momento de vida que lembra (ninguém lembra dos primeiros anos de vida, muito menos do momento em que nasceu). Como seria um beijo? O garoto beijaria bem? Seria nojento? Preferiu não fazer nada. O garoto encostou os tímidos lábios nos mais tímidos ainda da menina. Os dois fizeram careta no final, tiveram a mesma impressão ruim de primeiro beijo: Tinha gosto de cuspe. “Eu, eim, prefiro muito mais caminhar e ouvir o canto dos pássaros do que isso!”, pensou ela, “Eu, eim, prefiro muito mais os pokemons ou meus carrinhos do que isso!”, pensou ele. Andaram de mãos dadas pela escola inteira, dando “estalinhos”, nome que deram a tal ato com gosto de cuspe. Todos que viam faziam cara e sons de enojados.

Depois daquele dia, nunca mais acordou cedinho para ir caminhar ao lado dos pássaros, com a mão livre e nunca mais respondeu sozinha ao bom dia das aves. Agora ela o tinha ao seu lado. Depois despediram-se com um estalinho seguido de careta de nojo e ela foi à casa de uma amiga. Quando foi perguntada como foi a sensação de ser beijada, respondeu com firmeza: “Tem gosto de cuspe e eu prefiro andar com os pássaros, mas eu não quero nunca ficar sem tocar na mão dele por muito tempo.”