Sunday, October 05, 2008

Canção de Ninar

Mal posso esperar o momento chegar. Sonho todos os dias (sem faltar nenhum) com teu nascimento, com a chegada tua e da minha alegria. Vou criar-te apelidos bobos, apertar-te de jeitos tolos e amar-te puramente. Vou acordar de madrugada com teu choro, música para meus ouvidos, e vou cantar-te até o sono, enfim, chegar-te. E te admirarei a noite inteira; tu dormindo e eu sorrindo na espera de um novo gesto meigo, puro e lindo.
Quando a manhã enfim chegar, para o trabalho irei com o pensamento em ti. Mal podendo esperar o momento de encontrar-te novamente, fico o tempo todo olhando o relógio, gritando para o tempo, pedindo que aquele danado passe mais rápido. Quando cresceres um pouco, serás a minha menininha, e eu te protegerei com minha vida. Quando ficares mais adulta – virando moça –, terei ciúmes de teus namorados e desejarei a morte de todos, mesmo sabendo que eles te farão feliz. Terei medo que me troque por eles e que façam de ti, uma menina mais feliz do que eu consegui fazer. Ao saber disso, me lançarás um sorriso rasgado e dirás que ninguém é mais importante e te faz mais feliz que eu mesmo, e eu notarei que a vida está passando. Logo, então, chegará teu casamento e eu estarei lá pra te levar até o homem que escolheste. Voltarei para a casa pensando: “minha menininha definitivamente cresceu”. Voltarei feliz. Voltarei para minha cama quente, recolherei meus cabelos grisalhos e, mais uma vez, gritarei com o danado do tempo, mas agora para que ele passe mais devagar. Vai, tempo, vai falar com a morte e pede para que ela tenha piedade desse velho pai que só quer passar mais tempo com sua filha. Mas e quem sou eu para pedir algo para a morte? Ela não respeitará nem o pedido do tempo, nem a mim. Um dia, chegará em meu quarto, bem de mansinho e dirá: “Vem, Fernando, tua filha ficará em boas mãos”. Falará de um jeito doce para que eu não chore, mas minha vida toda passará diante de meus olhos, se transformará em lágrimas e cairá diante do fim. Lá de cima, passarei o tempo (danado que não me deixa em paz) todo te observando, cada passo, cada gesto meigo, puro e lindo. Só, então, perceberei que nada mudou.