Monday, December 01, 2014

Música para combater o machismo

O leitor pode fazer o exercício. Pense em dez bandas de rock mais famosas em todos os tempos no mundo inteiro. Pode pensar em vinte. Talvez em trinta. Procure, neste número que veio a sua cabeça, quantas são formadas por mulheres ou ao menos têm uma como protagonista. Muito provavelmente serão poucas. Pouquíssimas. E isso não é resultado, como os homens insistem em acreditar, de demérito dos grupos formados por elas. É consequência de séculos, milênios de machismo, estando este presente nas mais variadas parcelas da sociedade, inclusive no meio musical. Em Pelotas não parece ser muito diferente, mas uma banda tenta lutar contra a opressão através das fortes e rápidas notas do punk rock. Apesar de estar com nova formação, a She Hoos Go não arreda pé do feminismo.
A influência vem principalmente de Joan Jett, que costuma figurar em listas de melhores guitarristas de todos os tempos - quase sempre a única mulher - desde os tempos do The Runaways, banda clássica do feminismo musical. Em 2012, ano em que se apresentou no Lollapalooza Brasil, Joan comentou o machismo que reina o meio. Contou de quando, ainda adolescente, se aventurou na música pela primeira vez influnciada pelo camaleão David Bowie e Suzi Quatro. Decidiu então fazer aulas de violão, ao que ouviu: meninas não podem tocar guitarra, muito menos rock.
A mesma frase foi vociferada à ela diversas vezes durante a sua carreira. Mulheres têm de tocar instrumentos delicados, como violoncelo e harpa, nunca guitarra. Joan, porém, sempre calou os machos com a força de uma rockstar e é dona de I love rock'n roll, um dos maiores hinos do gênero.
Nunca se entregar
O espírito foi incorporado também na She Hoos Go. "Passamos por diversas mudanças na formação, mas nunca nos abalamos, nunca nos entregamos", comenta a baterista Simone Del Ponte. A banda foi criada no verão de 2010, primeiramente com o objetivo de tocar covers de bandas como o próprio Runaways, o L7 e o Hole, resistência feminina no grunge dos anos 90, entre outras. A partir daí vieram shows em festivais de Pelotas, outras cidades do Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, o qual consideram o mais importante até os dias de hoje.
Após última mudança, o grupo passou a ser formado por Simone, Lidia True Love nos vocais, Ariane Behling no baixo e Giuliano Jack Strat na guitarra. A baixista é quem comenta possíveis transformações trazidas pela incorporação de novos membros. "O som está mais agressivo e engajado, o vocal da Lidia trouxe uma cara nova pra banda e o Giuliano na guitarra deu uma energia extra nas músicas.
shehoosgo1
Empoderamento
Junto com a nova formação, na última semana a She Hoos Go terminou de lançar quatro músicas. Anteriormente compostas para formarem um EP, as canções foram mostradas ao público individualmente e evidenciam que a chama da luta contra o machismo permanece acesa em versos como Eu não posso esquecer o que você disse, é sempre igual, dia após dia, ou Você pode até procurar por uma Afrodite, mas há uma bruxa em seu caminho. E ela pode ter cabelo preto, cabelo vermelho. 
Segundo Simone, a música como alerta e arma contra o machismo é importante, por exemplo, por empoderamento. "Podemos passar através de nossas letras as vivências do dia a dia, das lutas que travamos pelo feminismo." Ela, porém, acredita que aos poucos a luta tem sido vencida, pelo menos nas guitarras. "Antigamente tinha muito mais preconceito em relação às mulheres no rock. Ainda tem algumas pessoas que acham que as mulheres não têm capacidade de fazer musica, mas acho que esse pensamento retrógrado está se dissipando."
Entretanto, ainda segue vivo outro problema: o de certa sexualização sofrida por mulheres no mundo da música. Ser reconhecida pelo som, e não pelo fato de ser do sexo feminino. Algo que a vocalista da moderninha Chvrches, Lauren Mayberry, cansa de falar em seus discursos sobre gênero, recusando o rótulo de "apenas mais um rostinho angelical na música" e condenando inclusive aqueles fãs da banda que se mostram apaixonados pela Lauren dentro dos padrões de beleza impostos pela sociedade do que exatamente pela Lauren exímia vocalista e ser pensante. Simone partilha da opinião da escocesa: "É uma situação superchata não ser levada a sério por ser mulher ou por ser considerada bonita (faz sinal de aspas). Esse tipo de pensamento e atitude não cabe mais".
Riot Grrrl 
Movimento criado nos anos 90 abrangendo fanzines, festivais e bandas de harcore e punk, o Riot Grrrl (lê-se Riot Girl) surgiu com o objetivo de se estabelecer como um movimento cultural feminista, incentivando a mulher a se informar e reivindicar seus direitos. Tendo a música como um de seus principais alicérces, o Riot Grrrl foi incentivado por bandas como Bikini Kill e Bratmobile. Atualmente, a provável principal representante é a Pussy Riot.
Outras bandas protagonizadas por mulheres em Pelotas
- Vetitum
- Nefertiti
- KAME
- Trail of Sins
- M26
- Gru

*Matéria escrita para o Diário Popular

No comments:

Post a Comment