Thursday, May 31, 2007

Máquina dos Sonhos

Acordei um dia a me perguntar se era realmente eu um ser que sonha, ou um sonho que é. Desculpe a indiscrição de me apresentar rapidamente. Meu nome é Duarte. Na verdade é Vitor, mas todos me chamam de Duarte, por causa da minha estranha mania de chamar os outros pelo sobrenome.
Tenho olhos levemente cinzas, cabelo castanho claro e uma facilidade incrível de entrar em situações adversas. Como ia dizendo, tenho muitas dúvidas sobre os sonhos. Sempre achei muito ríspido e tangente dizer que são apenas o cérebro que não pra nunca de funcionar. Procuro há alguns anos a solução para isso.
Eu sempre fui considerado um idiota em meu colégio. Sempre fui aquele que todos odeiam e que almoça sozinho lendo um bom livro e ouvindo música. Seria hipocrisia de minha parte dizer que acordei naquela quarta-feira já sabendo que minha vida mudaria totalmente. Não. Acordei pensando ser aquele mais um dia terrível naquele frio colégio.
Eu conversava com Rafael Cosme, única pessoa que um dia me aturou. Meu único amigo, conheço há dez anos. Estamos fazendo bodas de caramelo de amizade¹. Segue a nossa conversa:
– Cosme, o que são os sonhos? – disse eu
– Como assim, Vitinho? - respondeu Rafael
– Os sonhos, ora, o que são eles?
– É o cérebro trabalhando enquanto o resto todo descansa. Nunca te ensinaram isso?
– Mas se for isso, a gente sonha o tempo todo!
– É.. Nunca pensei por esse lado.. Meu pai chegou, até amanhã, Vitinho.
Despedi-me de Rafael, enfiei as mãos nos bolsos do casaco e voltei para dentro do colégio. Não imaginava que faltavam poucos minutos para que aquela quarta-feira mudasse de um qualquer, para um dia especial. Comecei a ouvir uns barulhos estranhos que pareciam vir de um local fechado, mas de onde? De onde vinham aqueles ruídos que me arrepiavam? Não sabia. Continuei a procurar, então. Parecia que a cada vez que o som aumentava, mais distante eu estava dele. Eis que acho uma porta tremendo. Era ali, vinha dali o tal barulho estranho! Abri a porta. Assustei-me com o tamanho daquela máquina. Comecei a analisar aquilo, e depois de muito tempo achei uma sigla: “MDS”. Mas o que aquilo significava? Aparentemente, nada.
Tentei criar combinações para ela, como “Minha Doce Sandra”, ou “Máquina de Sucos”². Até que pensei na possibilidade de significar “Máquina Dos Sonhos”. Pensei em levá-la para casa, mas como? Não tinha como, era muito grande e eu só tinha meus lindos e pequenos bolsos. Fiquei desiludido de não poder fazer o que queria, mas acabei desistindo de arranjar um jeito de levá-la para o meu quarto e começar a desvendar os sonhos de todos. Estava tão concentrado que não ouvi a meu pai buzinando na frente do colégio.
Fui embora depois de muito tentar arranjar um jeito para levar a tal máquina para casa. Quando ia saindo do corredor, meu pai estava gritando desesperadamente meu nome e me mandando entrar rapidamente no carro. Passei o trajeto todo calado, pensando somente no momento incrível que acabara de viver.
Quando cheguei em casa, fui surpreendido pelo mesmo ruído da tal máquina.
– Pai, tu estas ouvindo?
– Ouvindo o que, Vitor?
– Esse barulho!
– Que barulho, tá ficando louco, guri?
– Esquece, pai.
Saí da sala de cabeça baixa e tratei de ir correndo para meu quarto.
Ao chegar lá, tive a maior surpresa da minha vida. Ali, ao lado do meu guarda-roupa, quase que escondido no meu daquele monte de coisas, estava ela: A Máquina dos Sonhos.
Confesso ter sentido medo ao chegar perto daquela coisa grande, barulhenta e brilhante. Pensei em correr até a sala, chamar meu pai e contar-lhe sobre a tal máquina, mas percebi que aquela era uma decisão muito arriscada, e decidi, então, contar apenas para Rafael sobre aquele trambolho.
Passei a noite inteira tentando descobrir como fazer funcionar a tal máquina. Estava tão compenetrado, que nem percebi que acabara de nascer o sol, e eu tinha que me arrumar para ir para o colégio e contar tudo para Cosme.
Pelo caminho, quis dividir com alguém a emoção de ter uma Máquina de Sonhos no meu próprio quarto, mas lembrei-me que estava sozinho, e então me contentei em tentar conversar comigo mesmo, para isso, criei um segundo Vitor. Para ele, dei o nome de “Silva”. Parece loucura, mas conversei com meu segundo eu por um tempo que não conseguira falar com ninguém até aquele dia. Foi aí que me convenci que eu era uma pessoa agradável. Mas fiquei me perguntando se teria eu inventado Silva, ou Silva havia me inventado.
Cheguei à escola e fui logo procurando Rafael.
– Cosme, Cosme!
– O que foi, Vitinho?
– Aqui não dá, vamos para a cantina.

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1: Bodas de caramelos é uma história real, de duas amigas que estão fazendo dez anos de amizade. O porquê de caramelos? Sei lá, pergunta pra Cecília ou pra Luíza.

2: Máquina de sucos é uma música da minha banda, Debulle.

5 comments:

  1. Anonymous6:40 PM

    ameeeei,ficou ótimo o texto,espero que tenho continuação,o bodas de caramelo foi ótimo ! :D

    :*

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  2. Anonymous4:58 PM

    E se sonhos são mundos paralelos onde a gente nem exista? ou as loucuras mais internas que a gente tenha? Não sei.
    Porém eu continuo sonhando, as vezes gosto, as vezes não (mas isso a gente resolve acordando, pelo menos até agora funcionou).

    adoro os teus textos! beijinhos! :*

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  3. Anonymous5:01 PM

    pd. acho bom ter colocado os créditos, piá! ><

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  4. Anonymous6:25 PM

    Lelê says:
    comenta qualquer erda

    Feito

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  5. Anonymous6:56 AM

    melhor conto que tu já publicou aqui! adorei, muito mágico!
    queremos continuação \o/

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